Brasilia, 10 de outubro de 2011.
- é sempre surpreendente e estimulante, para mim, a leitura de texto clássico, a exemplo de “O Retrato de Dorian Gray”. O conteúdo é sempre relevante e atrativo, desde que se dê o desconto do efeito danoso que o tempo opera;
- a narrativa é exuberante, ambientada no século XIX, em Londres e em Paris. È intensa em refletir os fatos e eventos da sociedade da época, com as intrigas e mistérios, no caso particular muito densa em explicitar os sentimentos, sensações e emoções, em clima algumas vezes melodramático;
- o foco do relato está na busca, pelo personagem central, da eterna juventude, desejo manifestado no pacto que o jovem , bonito e elegante Dorian Gray, assume com o impressionante retrato de autoria do amigo e pintor Basílio Halleward. Tal é a sua força, que o pintor se recusa a apresentar o quadro ora concluído em exposição , diante de todo o empenho que depositou na sua dedicada elaboração: “porque, sem o perceber, pus nele a expressão de toda essa idolatria artística, da qual, naturalmente, nunca falei a ele. Dorian não sabe de nada. E jamais saberá. Mas o mundo poderia adivinhá-la, e eu não quero abrir a minha alma diante dos fúteis olhares curiosos... Há demasiado de mim mesmo nele... “;
- o ajuste entre Dorian e o quadro consistiu em estabelecer que Dorian manteria a sua aparência jovem e a extraordinária beleza enquanto o retrato suportaria todo o desgaste do tempo e das agruras da vida;
- Dorian dizia para Basílio: “Sinto ciúme de tudo aquilo cuja beleza não morre. Tenho ciúme desse retrato meu que você pintou. Por que ele poderá conservar o que eu vou perder? Cada momento que passa tira-me algo e dá algo a ele. Oh! Se pudesse ser o contrário! Se o retrato pudesse envelhecer e eu permanecer tal como sou agora!
- ganha dimensão, no livro, o personagem do grande amigo e influente Lorde Henry Wotton, o cínico e irreverente Harry, que induz Dorian para a busca incessante do prazer, das paixões e do pecado; Harry atua obssessivamente sobre Dorian e, para influenciá-lo, empresta-lhe um livro estranho, “uma novela sem enredo, com um único personagem”. “Era um livro cheio de veneno”;
- o romance, através do cínico Harry, cativante e pretencioso, desenvolve diversas teses contundentes:
a) a vantagem das emoções consiste em nos desencaminhar, e a vantagem da Ciência, em não ser emotiva”;
b) “meu caro amigo, nenhuma mulher é gênio. As mulheres são um sexo decorativo. Nunca têm nada a dizer, mas o dizem de maneira encantadora; as mulheres representam o triunfo da matéria sobre a inteligência, exatamente como os homens representam o triunfo da inteligência sobre os costumes:”
c) “Porque todos os pecados, como nos lembram os teólogos, são pecados de desobediência”;
d) “A vida real era um caos, mas existia alguma coisa e terrivelmente lógico na imaginação. Era ela que colocava o arrependimento no rastro dos pecados. Era ela que proporcionava a cada crime sua prole horrenda. No mundo dos fatos comuns, nem os maus eram castigados, nem os bons recompensados. Os fortes alcançavam o êxito e o fracasso era reservado aos fracos”;
e) “A civilização não é, de forma alguma, algo fácil de conseguir. Só há duas maneiras de chegar a ela. Uma é a cultura e a outra a corrupção. A gente do campo não tem oportunidade de entrar em contato com nenhuma das duas maneiras. È por isso que permanece estagnada”;
f) “É claro que a vida conjugal não passa de um hábito, de um mau hábito, por sinal”;
g) “O crime é propriedade exclusiva da classe baixa. E não a censuro por isso. Imagino que o crime é para ela o que a arte é para nós: simplesmente um meio de alcançar novas sensações”.
- é quase fantasmagórica a descrição da cena, em plena madrugada, do assassinato do pintor Basílio, a facadas, abruptamente, no quarto da residência do Dorian
Gray.
- enfim, trata-se de leitura com variados atrativos.
O abraço do
Antonio A. Veloso.
ANTONIO A. VELOSO